terça-feira, 18 de novembro de 2008

Mister Antônio

Antônio e Laura. Eram casados a mais de vinte e cinco anos. No ano passado celebraram suas bodas de prata em uma viagem inesquecível a Santa Lúcia no mar do caribe. Ele engenheiro de uma grande multinacional, já prestes a se aposentar. Ela arquiteta que executa projetos indie para celebridades de televisão. Tinham dois filhos estudando em faculdades longe dos pais, se amavam e levavam uma vida confortável e honesta.

Certo dia. Laura comentou que uma grande amiga Núbia, fiel companheira da época em que faziam o ensino superior em Fortaleza ligou, pois estava voltando para o Brasil no próximo fim de semana, depois de passar cinco anos morando em Glastonbury uma pequena cidade em Somerset, Inglaterra, situada a 50km (31 milhas) ao sul de Bristol. Era inverno no Brasil, então resolveram fazer uma bela recepção para a amiga, que Antônio insistia, mas não conseguia lembrar de sua imagem ou semelhança.

Durante a semana, até o dia da chegada. Laura revia fotos, mandava emails, planejava uma bela recepção de comida japonesa, lembrava das boas risadas que dava com a amiga, tomava o elichir da juventude diáriamente e Antônio indiferentemente apenas lia seu jornal sempre a noite, antes de colocar comida para os pássaros e dormir.

No sábado pela manhã. Tomaram banho, aprontaram-se e foram para o aeroporto, onde tomariam o café da manhã. No trajeto, Laura recebeu um telefonema de sua amiga, de que o vôo atrasaria em uma hora. Eles já empolgados e contagiados com a chegada, resolveram aproveitar o tempo e comprar flores para a recepção. Os pais de Núbia moravam em Córdoba na argentina, há quatro anos e ela já tinha se separado do marido antes de ir, tinha um filho, que morava com o pai em Lucas do Rio Verde, Mato Grosso, para onde iria na segunda-feira, para em seguida ir encontrar seus pais.

Depois de mais um atraso de mais uma hora. O avião chegou e foi aquele saudoso encontro. As duas não paravam de se abraçar e de passar as mãos nos cabelos da outra, como se fosse o encontro de duas espécies diferentes, porém amistosas. Antônio apenas sorria de canto de boca e instantaneamente se prontificou para levar as malas.

Já em casa, tinha um sushi-man que já estava mandando ver. Laura em cima da hora viu que faltariam mais alguns condimentos e foi a mercearia do bairro comprar. Antônio e Núbia ficaram a conversar sobre o frio, a política e sobre o Brasil, enquanto tomavam caipirinhas de saquê.

Quinze minutos se passaram e ao regressar, enquanto colocava a chave na fechadura. Laura teve a nítida impressão de que Antônio conversava em inglês com Núbia. Ao entrar, os dois interromperam o assunto e Núbia prontamente trouxe mais uma dose para Laura. Ela achou que era coisa de sua cabeça e foi matar a vontade de comer sushis.

Mais tarde já com os estômagos orientalizados e a mente ocidentalizada, enquanto Laura ainda perguntava sobre a experiência da amiga em outro país. Núbia proferiu:

- Mas que inglês ótimo que seu marido fala? Poderia muito bem se passar por um bretão.
- O quê? Antônio nunca falou uma palavra em inglês em toda sua vida! Ele devia estar brincando ou já bêbado.
- O que é isto Laura! Vai dizer que você não sabia que seu marido fala inglês?
- Não é que não sei. Ele não sabe, assim como eu!
- Então tá. Deixa pra lá...

As duas ficaram mudas. Antônio já roncava no quarto e a conversa foi diminuindo até que Núbia disse que pela manhã, já estaria de partida. Laura sem hesitar concordou. Ao alvorecer, Núbia partiu de táxi e apenas deram um abraço nada caloroso. Não combinaram nenhum outro encontro e não trocaram telefones. Foi a porta fechar para Laura começar a lançar a sua desconfiança:

- Antônio! Desde quando você sabe falar inglês?
- Mas eu não sei querida! Você não sabe disso?
- Eu ouvi você conversando com a Núbia e ela me confirmou isto ontem.
- O quê? Estavamos a falar sobre a vida na Inglaterra, mas palavras em inglês? Onde já se viu, não sei nem dizer obrigado em outra língua?

Laura não se conteve e a partir deste dia investigou suas coisas, revirou suas cuecas, perguntou aos amigos de empresa, parentes, chegou a procurar seu analista de um ano atrás, foi a escola em que estudou para analisar a grade escolar, revirou, futricou e infernizou a vida de Antônio atrás de uma informação do misterioso conhecimento da bendita língua inglesa.

Daquele fatídico dia em diante, não houve um só dia em que Laura não questionasse o pobre marido. Só disse que voltaria a colocar o café da manhã na mesa, a devolver suas chuteiras e a assitir juntos aos documentários de domingo na TV, quando dissesse a verdade. E a verdade era em outra língua. Antônio ficou mudo. Triste e mudo.

Depois de três meses de tortura e angústia. Ele escreveu um bilhete e deixou em cima da mesa da sala, apenas se despediu dos filhos e partiu. Só sei que no fim da carta estava escrito o seguinte:

Querida Laura. Aposentei-me e fui para Inglaterra aprender inglês, quando estiver sabendo tudo volto. Não me procure.

De quem sempre te amou.

Antônio.



Gilberto Granato

2 comentários:

Unknown disse...

No mínimo Antônio e Núbia se apaixonaram e os dois combinaram fingir falar em inglês para que o outro pudesse fugir e fazer com que a culpa toda recaísse sobre a pobre Laura. Ou então a Laura tomou um ácido e alucinou que o Antônio falava em inglês. Ou então o Antônio foi possuído pelo espírito da pomba Gira Inglesa e começou a falar inglês desembestadamente ajudado pela caipirinha de saquê. Ou então todos foram intoxicados por um fungo tóxico encontrado no peixe cru do sashimi e começaram a delirar cada um a sua maneira........

Anônimo disse...

Acho que quem tomou algum ácido foi vc Gil!!!!! Que doideira, isso saiu da sua cabeça mesmo??? Tô ficando preocupada.
Bjis, Xibé