domingo, 10 de agosto de 2008

Dia de vacina


Este fim de semana foi dia de vacina, pois é, nem eu lembrava que adulto ainda tomava. O primeiro passo quando se vai tomar uma vacina é correr atrás da importante e dependendo da sua organização indecifrável cardeneta de vacinação. Por exemplo, a minha eu não achei. Vê-la talvez me trouxesse mais lembranças (quem é que não esquece uma agulhada), mas por descuido ou por não tê-la procurado com mais empenho, não achei. Com isto... vamos recebendo aqueles papeizinhos avulsos e vamos colecionando os emblemas dos Sistema único de Saúde dos municípios do Brasil (deve ter colecionador disto).

Não vou dizer que lembro das primeiras gotinhas, claro, senão vão dizer que é passarinho, isto mesmo, passarinho! É o nome que os cronistas dão quando uma narração é inventada ou acrescida de detalhes ficciosos, mas duvido que um cronista não tenha cometido um passarinho, assim como, você não deva ter chorado nas suas primeiras agulhadas de infância.

Quando se é criança em dia de imunização é marcante. Primeiro você não sabe se sua mãe está falando a verdade, que será “apenas uma gotinha meu filho’, pois por trás desta gotinha pode estar uma bela injeção e quem sabe duas (sua mãe esqueceu a ultima campanha, perdeu o cartão, doença nova ...) Aí você mastiga o pão com manteiga pela manhã e só consegue comer meia aba, pois você não sabe, mas seu sistema nervoso simpático já está fazendo hora extra, sua boca começa a ficar seca, suas pupilas dilatam e seu coração acelera! Já na fila, tem aquele monte de crianças, umas achando que é fila de algodão doce, outras estão mudas já em estado de choque e tem aquelas que atrapalham qualquer campanha, as que choram e falam o que não se deve em uma hora destas: Vai doeeeeerrr!?!?! Pronto, todas as outras ficam em estado de alerta, começam a perguntar as mães e o murmuro se torna grande. A enfermeira, que sempre tenta mas nunca consegue, tenta acalmar a multidão com suas manobras nada pedagógicas. Tudo bem, todos estão tranqüilos novamente, só que você observa que aquele amiguinho que estava sorrindo mais cedo, volta chorando depois da vacina. Aí não dá para acreditar em mais ninguém e só resta pedir para Peter Pan, Super-homem e ultramen que te salve daquela emboscada. Mas sempre, no final, se termina com as lágrimas enxugadas, um sorriso e a promessa de um picolé de mini-saia da esquina.

Lembro uma vez na escola como fiquei impressionado, quando pela primeira vez fui imunizado por uma pistola (acho que este era o nome) não sei se existe mais, mas que tecnologia, um plec! E pronto estava tudo resolvido. A criançada ficava animada e ansiosa para ouvir o plec! Já maiorzinho (dá um bom nome de macarrão – me vê um pacote de maiorzinho!) tomei as antitetânicas da vida: prego no pé, pé cortado por copo de cerveja, arame enferrujado... Teve a obrigatória de febre amarela da extinta SUCAM para sair do aeroporto de vitória, que o diga o Drauzio Varella, que quase morreu por tal doença, na mesma região que morei no Amazonas. Por falar nelas (Amazonas eram os nomes das guerreiras que decepavam os seios para usar o arco e flecha e que deram o nome ao Estado) foi lá nas aldeias indígenas da região, que tomei a maior de todas “O Caxiri”. O Caxiri ou chincha é uma bebida tradicional feita através da fermentação de frutas sazonais amazônicas, onde as mulheres responsáveis por fazer, muitas das vezes cospem no sumo para acelerar a fermentação, principalmente quando o dia da festa está próximo. Participei de muitas festas destas e bebi o caxiri que é servido em cuias, que passeiam de boca em boca por várias horas, sem falar nas gusparadas e catarradas que tomava dos velhos (alguns tuberculosos) tentando se comunicar comigo em português, ali sim, fiquei imune a vários males, mas também desta vez esqueci o cartão.

Hoje ao sair do trabalho, enchi o peito e fui ao posto. Infelizmente não tinha ninguém (estava querendo uma fila para ouvir conversas de vacina) apenas a equipe de saúde, cumprimentei a todos, já conhecia um dos anotadores de cartão, que chupava um pirulito e direcionei-me para o ato. Lá estavam duas mulheres: perguntei se podia escolher o braço da aplicação “sem problema” a loira estrábica disse, levantei a manga da camisa do braço esquerdo, concentrei meu olhar na morena que sorria e pronto, acabou! Nem vi a agulhada, agora sim, já poderia tomar minha cervejinha na esquina.


Gilberto Granato

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