sábado, 1 de agosto de 2009

Enolíngua

Mirla acabara de ser aceita pelo departamento de relações internacionais em Brasília, jovem, independente, sem filhos, com a vida toda pela frente, foi a Mendoza conhecer sobre vinhos e aproveitar os últimos dias de folga, no retorno, ligou para Sávio, que acabara de começar um novo negócio que não sabia qual ainda, tinha uma loja de calçados em um shoping da cidade, com sua ex-sócia e ex-mulher, que agora namorava um ex-advogado de pequenas causas, maduro, uma filha, com a vida quase toda pela frente, foi ao encontro de sua recém amada Mirla em um bistrô da cidade.

- Olá meu amor!
- Oi!
- Como vai o negócio?
- Tem alguns acertos ainda para fazer.
- Vamos tomar um vinho?
- Pode ser.
- Maitre! Aquele Malbec por favor!
- Mas não íamos tomar vinho?
- É um tipo deles amor!..
(o Maitre traz a primeira garrafa, serve os dois, Sávio toma tudo, Mirla manda voltar, pois segundo ela o sabor estava muito plano, sem corpo, chato.)
- Experimente este senhora, sugestão da casa.
- Hum! Ecorpado! Pode servir.
- Uma delícia este né amor, é longo, veja o sabor permanece na boca.
- Â-rrâ.
(...)
- Maitre! Agora vamos tentar um branco
- (o Maitre fica encucado, traz duas taças).
- Não sei... deixa eu ver... acidez agressiva... muito ácido málico! Vamos tentar algo francês, mais duas taças, por favor!
- Nossa amor que delícia este, harmônico, um pouco tânico é bem verdade, mas perfeito não acha?
- É.
(...)
- Amor! acho que já estou ficando de pilequinho, vamos tentar mais um e ir lá pra casa, vou te mostrar as fotos da viagem e fazer uma massagem relaxante oriental ótima que aprendi no hotel.
- Claro, chef a saídeira!.
- Meu amor não fala assim! È Maitre.
(as taças derradeiras chegam)
- Nossa! Despedida perfeita. Aveludado, com retrogosto veja só amor, o gosto se manifesta de trás para frente na boca, o que você acha?
- Herbáceo.
- O que meu amor?
- Herbáceo.
- Onde você aprendeu isto?
- Não sei, acho que vi na televisão, não é herbáceo que fala?
- Nossa amor como você aprende rápido?
- É, vou ao banheiro.
- Ao Toilet amor! Vou ficar com saudades hein!
- Sávio nunca mais voltou.
(O Maitre diz que o viu pedir uma cerveja e sair a pé)



Gilberto Granato

2 comentários:

Unknown disse...

Para uma língua endurecida pelo espinho do pequi que nem a minha o vinho não vai bem quando vem junto com frescura.
Sabor aveludado, amadeirado, com toques ácidos de limão, odor de frutas silvestres da groelândia e cogumelos dos andes também e foda.. Hoje mesmo bebi um café "fino" que no rótulo dizia que tinha toques ácidos de limão. Limão no café é brincadeira!
Mas que uma tacinha de vinho tinto seco no friozinho de Pedra Azul faz muito bem pro coração, ah faz!

Anônimo disse...

É meu amigo, esse papo de retrogosto me reportou aos tempos da FOC onde o vinho era no galão de 5 litros tipo Galioto e Pergola,este último engarrafado em plástico, baixaria!

Depois de algumas doses, era um show de horrores, repulsão coletiva...

um grande abraço!

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