sábado, 2 de maio de 2009

O caso da vassoura

Notei esses dias. Que em cima de um banquinho destes de praça encontrava-se uma vassoura velha deitada, destas artesanais, feita de madeira e “mir de pinto”, assim chamado seus ramos pelos nativos de Castelo. Estava meio cansada da vida, quem sabe aborrecida por estar encostada, estafada de desabafar apenas com o pano de chão, afinal de contas, quem anda trabalhando muito ultimamente é o rodo, ou simplesmente cansou de ficar na área de serviço pendurada e resolveu viver sua vida mais ou menos como nós. E tenha optado como seu primeiro desejo repousar em um banco, antes de começar a tentar outras prosopopéias.

Perguntei a consorte e a emprega se a tinham colocado lá e obtive dois “nãos” como resposta. Então me pus a observá-la para ver até aonde este caso culminaria. Inevitavelmente veio a chuva e eu pensando que ela procuraria local mais seco para não molhar suas fibras e evitar um encontro indesejado com o rodo, engano meu. Permaneceu deitada apreciando os pingos daquela precipitação, removendo aquele montante de impressões digitais nada carinhosos de sua superfície, extraindo toda aquela poeira acumulada de meses, deixando-se apodrecer um pouco só para perder o costume. Devia olhar para o céu nublado a procura de uma estrela, ou talvez uma bruxa, pois desde a época medieval ela também serve de meio de transporte para ela. Pode ter sido isto, deve ter saído á noite com uma bruxinha pagã qualquer e de tantos devaneios e por já não ser tão jovem, a mandraqueira de chapéu deixou-a ali de castigo, ou de feitiço quem sabe.

Seu nome também alcunha animais, plantas, cidades ou até mesmo indivíduos mulherengos requestadores de mulheres fáceis, como diz o “pai dos burros” dicionário. Lembro até que ela é utilizada nas danças servindo de acompanhante para os desacompanhados, também serviu para açoitar os maridos bêbados chegando de madrugada em casa (hoje substituída pelos instrumentos perfuro-cortantes), para afugentar ou aniquilar (dependendo da intenção do usuário) os animais peçonhentos, amparando os mais baixos na busca pelo mais alto, benzendo, guardando segredos, no folclore: varra o pé de alguém para ver se casa? Deixe-a com o cabo para baixo, detrás da porta, para ver se a doce visita demorada e monótona não se lembra de fazer as despedidas e ir-se embora. Virou Nossa senhora da vassoura no Maranhão (devido a um popular cartaz de remédio que tinha uma enfermeira vassourando remédios inúteis), até o já ex-presidente Jânio Quadros se aproveitou dela como símbolo de combate a contravenção política e da luta contra a deterioração dos bons costumes.

Talvez esteja apenas enciumada com a inovação ecológica das vassouras pet ou com a tecnologia das elétricas que são ajustáveis, com reservatório e que já veem com suporte de parede, mas que dão problemas como tudo mecanizado e não teem a sua tradição, sua história, já falei, mas parece que ela não me ouvi, não sei se escuta, andar eu sei que anda, pois foi parar naquele banco. Definitivamente não consegui entender seus concretos sentimentos.

O tempo passou e ontem ela já não estava mais lá, perguntei a empregada aonde se encontrava e foi inevitável. Devido a sua ousadia, foi castigada. Uma mais nova “gostosona” e com tudo em cima está no seu lugar. E agora me deparo com ela na garagem (local mais temido pelos objetos desta casa). Andava meio que soltando o cabo da ponta (maior causa de óbito de vassouras) eu sei, meio gasta (era visível), babando tipo cachorro velho (preocupante!), já não removia teias de aranha como antigamente (agora ficará cheia delas), mas ir para garagem?

Foi um golpe duro demais.

Até pra mim que ando varrendo as boas idéias da minha empoeirada cabeça.



Gilberto Granato varre a casa de vez em quando.

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