quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Enficentro

Não sei se já existia, ou se só comecei a notar de uns tempos pra cá. Primeiro observei na fala dos formadores de opinião dos telejornais na TV, mais tarde vi que as celebridades começaram a aderir ao termo e dia destes me surpreendi com a minha cunhada proferindo a dita-cuja. E se chegou à boca da minha cunhada, pode crer meu leitor, virou epidemia, moda, é falado em todos os quadrantes, pode observar, tem cunhada não? Então assista aos debates de futebol, preste atenção no mestre de obra tentando explicar um acabamento complicado, nas tentativas de explicação dos fenômenos da natureza. Enfim, a palavra “enfim” é a bola da vez da língua portuguesa.

Pelo meu entendimento, ela é usada, toda vez que alguém está explicando alguma coisa e quando por insuficiência de adjetivos, blecaute cerebral, preguiça ou já se dar por satisfeita com a falança, solta este cartucho pra ficar entendido que não precisa falar mais nada, que já tá tudo bem explicadinho, que logo depois do “enfim”, vai só retificar o que está dizendo e pronto! Já é hora de fazer outra pergunta, de mudar de conversa ou de ir embora. Até aí tudo bem. Nada contra o termo que é muito bem empregado, substitui o finalmente, por último, em suma, muito bem. O problema é que quando a palavra se populariza muito ela pode tomar outros rumos...

O aluno chega em casa com o boletim todo vermelho, a Mãe ao perguntar o porque de tanta decepção, ouve apenas a seguinte resposta: Mãe! Não deu mãe, não deu, enfim, não deu! A mãe atônica, não diz mais nada, pois aprendeu que depois que o “enfim” aparece na frase, não vem mais nada, é o fim, o silêncio, a recuperação, é o desfecho da conversa e só resta a ela procurar uma professora particular, ou um psicólogo urgentemente. O maridão chegando do trabalho. Todo mundo chega do trabalho, até aí tudo bem, mas já são duas da manhã, e de uma terça-feira e o time dele não joga na segunda divisão o que dizer? Veja bem o que acontece: Meu amor, sai tarde do trabalho, no caminho tive um probleminha (os diminutivos ficam para uma outro análise) no carro, depois no celular... enfim meu amor, deu tudo errado! Neste momento faz cara de fatigado e corre pro banheiro para apagar as pistas, ou melhor, tomar banho sem chances pra consorte. Tá vendo? É o “enfim” encerrando qualquer hipótese de discussão, argumentação, ou explicação. Veja este outro caso. A bonita moça analisa o pedido de casamento, o pretendente está ansioso por uma resposta, é quando ela educadamente tenta falar de todas suas qualidades, e já com as bochechas rosadas pelo desconforto da situação profere um “enfim”, e o que vem depois do enfim? enfim, um pé na bunda.

Se esta moda não passar. Será necessário colocar um centro de informação em cada escola, em cada cidade, em cada esquina, só para orientar as pessoas sobre o emprego do enfim. Chamar-se-á “Enficentro”. E é através dele que as pessoas aprenderão a analisar se o “enfim” é verdadeiro, ou falso, se o enfim é um advérbio justo ou apenas uma engabelação, se ele é proposital, ou espontâneo, enfim, não vai dar certo. Terá mesmo é que inventarem um GPS com um decifrador de “enfim” aí sim, com ou sem enfim, poderemos viver despreocupados destas ameaças, que tomam conta de vez em quando de nossas línguas malcriadas.



Gilberto Granato

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