quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Chegará o dia em que...

O nobre leitor ou leitora, já cansado do feijão-com-arroz . Entre neste meio de comunicação e sem querer, de maneira despretensiosa, quase que inoportuna, acabe lendo uma destas bisonhas crônicas. E depois de alguns minutos até o ponto final, de forma simples e surpreendente apareça um leve e aconchegante sorriso no canto de sua boca, que irá aumentar, aumentar, até fazer florescer sentimentos ocultos, que o faça subitamente levantar da poltrona e dar um grito bem alto de livre-arbítrio. E que os vizinhos espantados liguem imediatamente para a polícia, ou preocupados venham bater a sua porta, para matar a curiosidade da rua inteira. E ao chegarem encontre você na frente do computador se remoendo de risadas e de arrependimento por só ter encontrado este portal da alegria, só agora.

Que o faça acordar mais cedo todos os dias, para ver se há algo novo escrito. E que se não, pelo menos que se transforme em um tempo a mais, para ler as crônicas antigas sem preconceito, sabendo que as piores, mesmo sendo a maioria, poderiam ter sido escritas em um dia difícil, talvez cansado do primeiro trabalho, sem inspiração, com sono, ou com o filho abrindo as gavetas e jogando tudo pra fora. Não importa. O certo é que as palavras estranhamente encaixariam perfeitamente no seu estado de espírito e que fizessem abrir os seus pulmões para o ar do lirismo. E que a leitora entusiasmada (coisas de gênero) contasse pra duas amigas, que contassem para mais duas e uma tia e assim sucessivamente, até chegar ao ponto em que a página ficasse sobrecarregada, difícil de abrir de tantos leitores e comentários, e que agora por uma questão de organização, ficariam restritos ao número máximo de cem.

Seria preciso largar o futebol de domingo, para ler a todos, traduzir alguns e responder por educação aos mais indiscretos, que não se contentariam só com a leitura e exaltados, gostariam também de saber do meu estado civil, da minha banda favorita, ou do meu tipo de desodorante. Estranhamente seria me dado uma laranja a mais pela caixa do hortifruti, o jornal me seria entregue em casa e receberia convites para ser padrinho de casamento de pessoas que nunca vi. O interfone e o telefone começariam a tocar incessantemente, instituições filantrópicas pedindo contribuições achando eu já estar milionário, patrocinadores querendo colocar suas marcas na página principal e em mais um monte de lugar e até minha professora de português, já com um português meio caquético, surpresa, me dando os parabéns toda feliz por achar que tinha sido a responsável por tudo isto. Teria que comprar um celular, andar de relógio de pulso e não deixar um fiapo de barba à amostra (coisa de patrocinador). Nem pensar ficar com aqueles shorts surrados, recluso nos fins de semana ou colocando canjica para os pássaros. Teria uma equipe multiprofissional, cuidando de tudo pra mim, a consorte de tantas intervenções do meu “personal cabeleireiro” ficaria irreconhecível, a cadela teria uma roupinha de pet shop e meu filho não tiraria mais um pirulito da boca.

Como dizia a professora de redação...

Seria tudo uma mixórdia!


Gilberto Granato, é anônimo e vive no anonimato.

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Extinção

Elas estão em franco processo de amortização. Não “elas” sujeito da oração, mas seus nomes próprios dados e talvez herdados de seus pais. Afinal meu leitor de fim de semana, você conhece alguma criança que tenha nascido recentemente e que se chame, por exemplo, Deusnira? Provavelmente não. A esta hora quem se chama Deusnira está em algum lugar do Brazilzão fazendo chup-chup de jaca pra criançada.

Nome hoje, depende de três fatores, por ordem de relevância: sanidade paterna, novelas da Globo e filmes de Hollywood, isto sem mencionar os tradicionais e vitalícios nomes bíblicos, que tirando a tentadora Eva, acabo de lembrar das peles enrrugadas das Donas Efigênias, Clotildes e Florentinas, que não passam uma noite sem ler um versículo se quer. E o bordado? Corre o risco de perder sua história, o detalhe, a originalidade, pois as donas Rosalitas, Furtunatas e Enerstinas que sabiam dos segredos do ponto e cruz e dos fios de algodão, hoje já têm dificuldade em passar o fio pela agulha, devido ao problema nas vistas ou as tremedeiras da idade. E aquele tradicional doce caseiro depois do almoço? Está com os dias contados. Não será mais o mesmo depois que as Santinas, Giocondas e Iolandas se forem. Nos contentaremos mesmo é com os seus dublês artificiais de supermercado. E o remedinho do mato tira e queda pra acabar com a piriri? a reza pro mau olhado? A previsão exata do tempo? Quem assistirá o Silvio Santos no domingo? Quem matará as galinhas caipiras do quintal? Só se as Matildes, Lourdes e Margaridas deixarem tudo bem explicadinho em algum papel de embrulho de pão qualquer.

Todas devem estar a esta hora solitárias em alguma varanda. Sentadas nas cadeiras que levam a suas marcas, lembrando (as que tem memória) saudosas de seus dotes, do tempo em que se entregava o leite em charretes de porta em porta, se andava de calças e de cabelo penteado, se dava o bom dia de bom grado, do sincretismo do angu com feijão. Coitadas das Fransiscas, Ofélias e Dolores que agora são obrigadas a tomar coquetéis intermináveis de remédios e a terem que esperar ansiosas o genro terminar de tomar a ultima cerveja, para empurrar a cadeira de rodas de volta para casa.

Partirei de trem. Mas não, sem antes desejar um boa noite para as Jovelinas, Zilas e Coralinas que logo após o anoitecer, já dormem em alguma casa de filha mais velha, asilo ou... Não, não. Sem final melancólico. Devem estar sorridentes, dançando de batom vermelho selvagem, cabelos pintados e com as bochechas cheias de ruge em algum clube da terceira idade de alguma cidade com ordem e progresso.

Já os sobrenomes?

Ficam pra uma outra história.



Gilberto Granato.

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Cherne

Já passavam das 12:00 horas. Leonor finalmente chegava com a sua “garoupa com banana da terra e pirão de peixe” de domingo. Tradicional prato da família Silva. Jonas já faminto, mais uma vez elogiava e bajulava a esposa, enquanto os filhos atacavam o prato antes que ele tocasse a mesa. Há vinte anos sempre tinha sido assim, todo primeiro domingo do mês, exceto aquele em que a garoupa foi substituída por um mero (na visão de Leonor), já que Jonas sabendo que era o mesmo peixe, não quis se indispor com a consorte que vibrava com a aparência familiar do novo vertebrado. O peixe de domingo era sagrado. Todos sentados na mesa até que Leonor levanta a voz...

- O que é isto?
(Todos na mesa abandonam os talheres, um copo cai no chão)
- Isto o quê meu amor!
- Isto aí d... de...debaixo.
- Oras meu amor é a crosta que se forma no fundinho, da água da banana que estava muito madura.
- Não, não debaixo do seu braço.
(Todos imediatamente observam uma espécie de rabisco no braço de Jonas)
- É... isto aqui?
- Isto mesmo, levante esta camisa Jonas!
- Mas vamos almoçar primeiro depois eu conto a novidade a todos
(Jonas trabalhava no ministério público se aposentaria no fim do ano)
- Levante agora Jonas, antes que eu tire com as minhas próprias mãos.
(Jonas levanta a manga da camisa)
- Minha nossa Jonas! O que é isto?
- Uma tatuagem.
(nesta hora o filho caçula começa a chorar)
- Repita Jonas que eu não estou acreditando, uma o quê?
- Tatuagem meu deus do céu!
- Onde já se viu um senhor pai de família com uma tatuagem no braço?
- Pois é, resolvi fazer. Achei que era a hora.
(a filha mais velha se retira da mesa)
- Mas ela sai, não sai?
- Não. É permanente.
(silêncio total)
- Que figura é esta?
- Um peixe.
- Peixe? Que tipo de peixe?
- Uma carpa.
- Meu deus do céu Jonas! Aonde foi que você viu carpa nesta sua vida metropolitana?
- Não sei, eu ia fazer uma jaguatirica, mas aí achei esta bonita e pronto.
(silêncio total novamente)

Apenas o filho do meio comeu o peixe.

Ninguém nunca mais falou sobre o assunto.

(Domingo só se come marmita na família Silva)


Gilberto Granato

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

A era da informação

Cena1

Portugal. Pode ir Cabral. È só seguir em linha reta e vai dar tudo certo. Chegará às Índias sem sombra de dúvidas, vai que é quente, ah! Traga curry, por favor, dizem que é óptimo! Deu no que deu, Todo mundo nu. Comeram as índias.

Cena 2

Cabeça do cachorro. Onde fica a aldeia do seu pedro? O informante protui o lábio inferior mostrando a direção correta e diz: Fica logo aí pra frente, leva este peixe muquiado aqui pra ele... Faltavam dois dias pra chegar na aldeia do seu pedro. Comi o peixe.

Cena 3

Espírito Santo. Churrasco de noivado de um casal de amigos na beira do mar. Onde é que fica a casa? É só dobrar a direita depois do último radar de velocidade, traz o filho pra gente conhecer hein! O último radar era infindo. Chegaria às índias, a aldeia do seu Pedro meu informado leitor.

Quer saber?

A era da informação ainda não chegou.



Gilberto Granato.

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Corpos celestes

É impressionante a ciência não. Quando menos se espera, lá vem ela com uma nova descoberta. Pode ser uma vacina, um parente das cavernas, um eletrônico difícil de usar, um peixe cego do fundo dos oceanos ou uma nova receita sagrada para o bem estar dos seres humanos. Mas confesso que fiquei intrigado com a últimíssima novidade, que pasme, vi ontem no telejornal. A de que foi descoberto um novo anel quase invisível em saturno.

Há muito tempo não se ouvia falar de saturno. Saturno nunca fez parte do happy hour, do almoço de domingo, ou dos casais apaixonados que sempre preferiram a lua. Que me desculpem os astrólogos, mas os próprios cientistas só se preocupavam com marte, teve até robô indo lá incomodar a sua atmosfera, mexeram com plutão também, desclassificando-o como planeta anão, uma senhora injustiça, mas saturno? Andava trancado a sete chaves, só se tinha tempo para falar de crise mundial, do que estava por baixo do bigode (com vários sentidos, por favor) do presidente do senado e da seleção canarinho, que é sempre notícia independente da nuvem cósmica. Mas saturno? Foi demais, como é que tem gente neste mundo, que se preocupa com este planeta gigante, que de tão longe e difícil de ver, só agora conseguiram encontrar o seu anel também gigante (o que era presumível), que ficou lá quietinho no anonimato, por mais de 400 anos desde a invenção do telescópio?

Teve gente que se espantou com a demora, veja só! Mas graças a mudança do ponto de vista dos astrônomos e a falta de pressão da desatenta sociedade civil, fizeram com que tivessem bastante tempo para esta magnífica e instigante notícia de meio de semana. Dizem que agora animados com o feito, vão importunar outros planetas ainda mais, na busca de algo novo em pró da ciência. Confesso que fiquei surpreso meu leitor. Não é possível que nas minhas conversas com os amigos, familiares e traunsentes não tenhamos mencionados saturno entre um gole e outro. A última vez que proferi esta palavra foi na escolinha, onde a professora nos obrigava a decorar a seqüência dos planetas por ordem de distância do sol. Será que mercúrio ainda é vivo? Com este sol do jeito que está? E Vênus? Que dá nome ao vestuário masculino, Júpiter? Minha nossa! Já devo ter mandado alguém pra lá (com educação, por favor), Urano e sua cor azul esverdeada, Netuno, que tem nome de Deus romano dos mares e Plutão que jamais será esquecido e que será lembrando por toda uma carreira de sonhos infantis, já que agora não faz mas parte da ordem dos planetas (sorte dele que não será mais importunado por nenhum cientista, professor ou escritor).

Boas lembranças da época em que a distância entre mercúrio e plútão...

Era de um quarteirão!

Coisas do sistema solar.



Gilberto Granato, tem um telescópio em casa que há muito tempo não vê a lua.

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Manual do betume

Você meu leitor. Leva a família novamente para um passeio de carro pelo Brazilzão. Andar pelas estradas verdes e amarelas requer cuidados, tem MST e tem também suas letras isoladas, lama, saco plástico, ponte caída, quase caindo, balsa, atalho, boi, policial (nas horas sem sol) e bicho morto pra dedéu. O que acontece é que você que vive em um grande ou meio-centro, quanto mais distante você se distancia dele, da sua cidade matriz, do seu sofá, do controle remoto, mais diluída será a força centrípeta da razão, a aplicação dos seus impostos e maior é aquela buraqueira que aparece no asfalto, ou melhor, betume como propõe o título. Esta doença incurável que assola todos os pontos cardinais do país. E que para você leigo neste material aglutinante escuro e reluzente, de estrutura sólida, constituído de misturas complexas de hidrocarbonetos não voláteis de elevada massa molecular, será de grande valia para conhecer melhor esta patologia sem vacina.

O causador desta lambança toda são os patógenos, ou micróbios como preferir. Os pertencentes à classe das chuvas, ventos e sol escaldante são perigosos, mas o mais agressor é o caminhão com excesso de todo tipo de peso. Que gera com o passar do tempo pequenas trincas, fissuras, brechas na superfície daquele derivado do petróleo bruto, que se não cuidada através de um simples selamento, vão se tornando maiores e mais infectadas, podendo levar o condutor desde a um leve desentendimento com a consorte, uma troca de pneu furado, ou até a uma visita precoce aos céus ou a fonte do petróleo lá embaixo. Portanto para a recuperação do alcatrão, desculpe, asfalto, é necessário primeiramente a remoção das áreas desapoiadas ao seu redor e em seguida adotar uma boa limpeza do buraco, removendo todo tipo de impurezas, como pedras, lama, papel de bala, guimba de cigarros e gomas de mascar usadas. Logo após, faça a texturização em todo o trecho com o retentor do kit de máquinas específico (que também contém o amassador e o aplainador). Depois passe duas camadas generosas de piche líquido e deixe secar (enquanto isto espere embaixo de uma árvore, ou ajude a atrasar o trânsito com uma bandeirinha). Feito isto, finalmente coloque o material obturador novo, de preferência do pré-sal (se você lê isto no futuro) e se possível sem superfaturamento, para não impedir novas intervenções em outros locais sem a força da gravidade, siga a sequência do kit de máquinas conforme o manual do fabricante e dias depois de o polimento fazendo as faixas centrais e laterais da rodovia. E prontinho, pode sorrir à toa.

Ah! E não esqueça de voltar ano que vem para a revisão

È que sabe como é...

Pode dar um probleminha!

(Ao dia mundial do dentista e ao dia do dentista)



Gilberto Granato, é dentista de vez em quando.

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Intimidação

Cena 1

No jogo do meu time contra um dos seus rivais. Tô lá vendo o zagueiro do time adversário (por sinal um bom zagueiro) carregando a bola em direção ao goleiro do seu time (ato extremamente perigoso no futebol). Até aí tudo bem, ele é um bom zagueiro como já foi descrito, vai dar tudo certo, não tem porque a torcida se preocupar, a chance de errar é quase nula. Ele só não contava com o atacante do meu time (por sinal fenomenal), já ganhou copa, melhor do mundo algumas vezes, embaixador de algumas coisas nesta vida, hoje meio fora de forma, mas é ele, vivo, e respirando fundo atrás da bola. O zagueirão se atemoriza com sua presença, esquece de olhar pro goleiro, esquece de fazer o que sabe, não lembra de mais nada, vai ver a noite na reprise do futebol a besteira que fez, recuou a bola errado e o meu atacante colocou pra dentro. Tá vendo meu leitor, este é o poder da intimidação.

Cena 2

Na disputa de País sede dos jogos olímpicos de 2016. To lá vendo o Brazilzão (por sinal um belo país, dizem que é do futuro) carregando a esperança de milhões de pessoas, (menos algumas que nem sabem o que está acontecendo). Vai dar tudo errado. È país colonizado, cheio de pobreza, corrupto, nosso presidente não tem um dedo, dificilmente é quartel para algo mais importante neste mundo, assim como seus primos subdesenvolvidos, a chance de ganhar é quase nula. Ainda mais que o super-man yankee presidente da América, confirmou presença, o cara é foda, ou melhor, fuck! E vai lá na Dinamarca acabar com o pagode (o Brazilzão se atemoriza com a sua ida), todo dia tem notícia dele por aqui, dos seus cabelos brancos, da sua ida a lanchonete, da sua tia... Estamos de frente pro mar tentando enxergar o que ele faz lá em cima e de costas para os “cousins” daqui debaixo. Sempre foi assim, always! O que acontece no globo, perguntem ao “yes, we can” lá de cima da linha do equador, eles resolvem tudo, sempre foi assim, don’t worry, vai dar tudo certo, mais uma olimpíada pra contabilidade, afinal de contas “yes, we can”! Só que desta vez a bola tava murcha, o Brazilzão surpreendeu, começou a fazer o que sabe, know-how puro! Cansou de jogar na zaga e agora quis o meio de campo, andar umas jardas pra frente e o atacante não contava com isto, se deu bad! Tá vendo meu leitor...

This is not intimidation!



Arawãkanto’i tapirapé, vai as olimpíadas de 2016 no Rio de Janeiro.