Pra tudo nesta vida. Pensei isto, depois que uma amiga daqui do interior, fez suas malas e partiu pra floresta chuvosa. Foi trabalhar com os índios. Assim como fiz há uns anos atrás. A vida como ela é. Cheia de orifícios por onde vazam os que são mais delgados. Há tempo pra tudo: pra andar de cuecas no calor, pingar soro nos narizes dos guris por causa da secura, pra achar que agente é esmerado quando neva em alguma cidade do sul, ou pra levantar tudo por causa da enchente. E sempre assim. Pauta de matéria pronta pra qualquer jornal iniciando. Tá na Bíblia: “há tempo de nascer e morrer, há tempo de chorar e tempo de rir, há tempo de buscar e tempo de perder, tempo de guerra e tempo de paz...”. Já houve até tempo de reforma agrária neste país, hoje vivemos o tempo do bolsa família. Há quem acredite que o destino manda no tempo, e há os outros. Rebeldes sem causa, logicamente. Há tempo pra descer no escorrega, tomar o primeiro porre, casar e ter filhos, e depois aí sim, fazer tudo novamente, não necessariamente na mesma ordem. O tempo melhora ou piora as coisas, mastiga os segundos e rima com o esquecimento. O problema do negócio do tempo é não acertar o tempo. Igual a jogada de vôlei saca? Cê pula e quando vai ver a bola já foi. Diz que vai dar sol com pouca nuvem e na hora de estender a toalha começa a relampear no horizonte. Ceticismo puro. Quem anda fora do tempo é sujeito passional, a toda hora procura a máquina do tempo pra se lançar fora desta série interrupta e eterna de instantes, que é o tempo. Tem que estocar munição pras batalhas, pros embargos, pra bater boca com os imperialistas. Vai virar gênio (depois de morto) e vai estar sempre refletindo se seguiu a rota certa, olhando os mapas, consultando a bússola do tempo.Não perca tempo.
Gilberto Granato, é filósofo fora de tempo.
O ser humano. Que tal? A única espécie conhecida capaz de criar o fogo, cozinhar seus alimentos, vestir-se, além de utilizar várias outras tecnologias. Só se esqueceram do pão com ovo. Pois o ser humano é o único que come pão com ovo.
Estava de chinelos. Dedos sujos à mostra, sujo mesmo! Daquele jeito em que ao redor das unhas fica tudo preto. Não deve sair mais não, só com especialista no negócio. Era visível que o chinelo não dava conta de manter a extremidade dos membros daquele animal terrestre limpa. Digo animal com eufemismo, por favor, pois o homem de chinelos e dedo sujo foi o que bateu no meu carro. Logo eu, que ando na linha, ou melhor, entre elas, sempre com o farol aceso, cinto, olho nos retrovisores e nos cruzamentos e prestes a chegar ao meu objetivo intacto: a capital. Pois foi em uma inofensiva reta, sem ninguém na minha frente, ouvindo um rock dos bons, que veio da minha direita este assombrado mamífero, forçando tarso, metatarso e aqueles dedos do pé sórdidos contra o acelerador de seu carro, vindo a colidir com a lateral do meu, susto meu leitor, dá um susto. A sorte, se é que podemos dizer assim. É que pegou principalmente no pneu, o que ajudou a repelir o bagaceiro chinelão e a não ferir por demais a lataria. Fomos a Polícia rodoviária federal fazer o BO (boletim de ocorrência) e o cidadão depois foi embora, sem pedir desculpas e sem a polícia federal o multar por dirigir sem calçado e ainda por cima com aquele tipo de pé.